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segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

VIRGINDADE PERPÉTUA DE MARIA (DEBATE)



MARIA FOI VIRGEM, ANTES, DURANTE E DEPOIS DO PARTO?

- Não temos dúvida com relação à virgindade de Maria antes e durante o parto. Porém, depois do parto, não há nenhum fundamento bíblico que diga que ela permaneceu virgem. As justificativas dos católicos romanos sobre a virgindade perpétua de Maria são diversas e sem sustentação bíblica: Os irmãos de Jesus mencionados nos evangelhos eram filhos de José com sua primeira esposa; filhos de outra Maria; primos, parentes de Jesus.  Simplesmente bastaria uma leitura de Mt 1.25 para compreendermos que Maria não permaneceu virgem após o parto: "e não a conheceu enquanto ela não deu à luz um filho". "Enquanto" não deu à luz. Depois, tiveram filhos, como testificam os Evangelhos. Prefiro acreditar na Bíblia a ter que acreditar em argumentos com base em histórias ou interpretações forçadas do texto bíblico.
Biologicamente falando, com o parto de Maria ocorreu o rompimento do hímen, ou seja, deixou de ser virgem. A Bíblia não fala em um milagre em seu parto. Os relatos que temos são apócrifos.
Na tradição judaica uma mulher morrer virgem ou sem ter filho era uma vergonha, uma maldição. Um exemplo clássico na Bíblia é o da filha de Jefté (Jz 11.29-40). Ela pede ao Pai para chorar com suas amigas porque ia morrer virgem. "Então ela se foi com as suas companheiras, e chorou a sua virgindade pelos monte" (Jz 11.38). Ter filhos na tradição judaica é uma bênção. Maria não foi uma mulher menos agraciada, santa, porque teve outros filhos. A Bíblia é simples, clara. Não precisa inventar histórias para explicar o inexplicável.

- Gama: “O termo “até” usado por Mateus 1.25 não indica  mudança de condição, ou seja, Maria continuou sem ter relações sexuais com José”.

- O termo grego “ἕως” é uma conjunção e significa: Até que, enquanto, a fim de que.  No novo Testamento, “ἕως aparece várias vezes no sentido de mudança de condição, ação (Cf. Mt 2.13; 5.18; 1Co 15.25; Fl 1.10; At 20.11; 23.12; Ap 7.3). A conjunção  “ἕως” indica  temporalidade (aquilo que não é permanente). Assim, José não teve relações sexuais com Maria durante o tempo de sua gravidez, mas depois, eles tiveram relacionamentos íntimos próprios de marido e mulher.

- Gama: “Virgem conceberá e virgem dará a luz, onde na Bíblia fala de outros filhos de Maria. Você contraria a própria Bíblia, que diz que a virgem conceberá um filho, não dois, apenas um...”

- Esse "um" não é numeral, mas artigo.  Língua portuguesa: um, uma, uns, umas. Segundo a regra: "quando na oração aparecer os termos “apenas um” ou “somente um”, a classificação que devemos atribuir ao vocábulo “um” será sempre a de numeral". Não é o caso do texto. Para "um" ser numeral em grego tinha que aparecer os termos: ενας, μια, ενα - Estes termos não aparecem no texto grego.
Jesus é o filho primogênito de Maria
(“prototokos”) (Primogênito, primeiro nascido de uma mulher (Cf. Lc 2.7)
e unigênito de Deus (monogenes, em grego é usado pelas Escrituras com o sentido de filho único - Cf. Jo 3.16).
 Os nomes dos irmãos de Jesus mencionados nos textos bíblicos são: Tiago, José, Judas e Simão (Marcos 6.3). Sobre os irmãos de Jesus temos as seguintes referências: Mt 12.46,47; 13.55,56; Mc 3.31,32; 6.3; Lc 8.19,20; Jo 2.12; 7.3,5,10; At 1.14; 1 Cor 9.5).

- Gama: “Sobre os irmãos de Jesus, em nenhum lugar do NT está escrito que eram filhos de Maria”.

- "Não é este o carpinteiro, filho de Maria e irmão de Tiago, José, Judas e Simão? E não convivem conosco suas irmãs? E ficaram escandalizados por causa dele" (Mc 6.3). Nazaré não era uma megalópole que as pessoas não se conheciam, não sabiam quem eram os irmãos de Jesus e seus pais.

- Gama: “O texto de Marcos 6.3 não diz que os irmãos de Jesus eram filhos de Maria. Com respeito a isso, há duas teses:
- os irmãos de Jesus seriam filhos de José de um casamento anterior (posição defendida pelos cristãos ortodoxos); - os irmãos de Jesus seriam parentes próximos (posição defendida por São Jerônimo e amplamente aceita na Igreja Católica)”.  

- Se você prefere acreditar em glosas a ter que acreditar no próprio texto das Escrituras é uma escolha sua. Porém, não podemos distorcer ou adicionar ao texto bíblico informações simplesmente para justificar uma doutrina. O texto mostra que há uma relação dos irmãos de Jesus com Maria.
Como não há uma única informação na Bíblia que José era viúvo quando casou com Maria e teve filhos com sua primeira esposa, temos que admitir que os referidos irmãos de Jesus sejam filhos de Maria e José.

- Gama: “Em relação ao termo 'primogênito', trata-se de título de herança. Portanto, todo filho único é primogênito”.

- Primogênito é o termo utilizado para designar o primeiro filho de um casal, também conhecido como o filho mais velho, em relação aos seus irmãos consanguíneos. Quando na família se tem apenas um filho, não tem sentido usar o termo primogênito, mas unigênito.  
O primogênito tinha o direito de primogenitura que consistia em ocupar posto de liderança na família e receber bênção (Cf Gn 27.27-29). Na tradição de Israel, mesmo que um homem tivesse dois filhos com mulheres diferentes e amasse mais a mãe do seu segundo filho, o direito de primogenitura era sempre do primeiro filho (Cf. Dt 21.15-17).
Quando Lucas diz que Maria “deu à luz seu filho primogênito” (2.7) não estava se referindo ao título de herança, mas ao fato de ser o seu primeiro filho. É diferente do sentido usado por Paulo quando diz que Jesus é “o primogênito de toda a criação” (Cl 1.15). Aqui, primogênito não significa que Jesus foi o primeiro a ser criado, mas que o mesmo é privilegiado, “pois tudo foi criado por meio dele e para ele”, explica Paulo (Cl 1. 16).
 Os textos bíblicos usam de forma adequada os termos primogênito e unigênito: "Quando chegou perto da porta da cidade, eis que levavam para fora um defunto, filho único de sua mãe, que era viúva; e com ela ia uma grande multidão da cidade” (Lc 7.12).

- Gama: “Definição bíblica de primogênito: "Santifica-me todo o primogênito, o que abrir toda a madre entre os filhos de Israel, de homens e de animais; porque meu é." Êxodo 13.2”.

- Ninguém questiona que primogênito seja o primeiro filho. Não era costume entre os judeus ter apenas um filho, pois quanto mais filhos tivesse uma família era sinal da bênção de Deus.

- Gama: “Não é possível provar pelas Escrituras que Maria teve outros filhos além de Jesus. Veja o caso de Tiago, o irmão do Senhor (Gálatas 1.19). Ele era um dos doze e filho de Alfeu”.

- Já mencionamos vários textos que mostram que os irmãos de Jesus são mencionados relacionados com Maria.
Tiago era um nome popular no tempo de Jesus. No novo Testamento conhecemos algumas pessoas com o nome de Tiago: Tiago, filho de Zebedeu, irmão de João (Cf. Mt 10.2); Tiago, filho de Alfeu (Cf. Mt 10.3; Mc 15.40) , Tiago, pai de Judas apóstolo (Cf. Lc 6.16; At 1.13) e Tiago, irmão de Jesus. O Tiago mencionado em Gl 1.19 é irmão de Judas (Cf. Jd 1.1; Mc 6.3) e “irmão do Senhor”. Tudo indica que os dois irmãos de Jesus, Tiago e Judas, converteram-se após sua ressurreição e estavam com Maria no cenáculo (Cf. At 1.14). Tiago tornou-se líder da Igreja de Jerusalém (At 15,1-21;21.18; 1Co 15.7) e apóstolo (Gl 1.9), apesar de não fazer parte do número dos doze. O Tiago mencionado na Carta aos Gálatas não é o filho de Alfeu, mas o irmão de Jesus.
O famoso historiador judeu, Flavio Josefo, menciona Tiago como o irmão do Senhor (Cf. História dos Hebreus, CPAD, Livro 20.8.856). Assim, temos não só a base bíblica, mas também o dado histórico para afirmar que o Tiago mencionado era verdadeiramente irmão de Jesus.

- Gama: “Se Maria, tinha outros filhos, por que Jesus confiou sua mãe para João e não para algum dos seus irmãos?”

- Os relatos dos evangelhos mostram que os irmãos de Jesus não acreditaram nele (Cf. Jo 7.5). Segundo informações que temos do NT, apenas Tiago e Judas converteram-se à fé cristã após a ressurreição de Jesus. Nesse cenário de incredulidade da sua própria família, Jesus confia sua mãe aos cuidados do apóstolo João na hora de sua morte (Cf. Jo 19.26).

- Gama: “Os irmãos de Jesus são primos, pois no hebraico é utilizada a mesma palavra para primo e irmão”.

- O argumento não se sustenta quando levamos em consideração que o NT foi escrito em grego e não em hebraico. Além disso, na língua grega, temos palavras diferentes para irmão (ἀδελφός -adelfós- Cf. Lc 8.19-20; At 1.14) primo (ἀνεψιὸς - anepsios – Cf. Cl 4.10) e parente próximo (συγγενίς – suggenes- Cf. Lc 1.36; 1.58; 2.44;14.12; Jo 18.26;At 10.24; Rm 9.3;16.7,11,21).

- Gama: “Os chamados irmãos de Jesus eram seus discípulos”.

- Quando os evangelhos usam o termo “adelfós” (irmão) em relação aos irmãos de Jesus eles ainda não acreditavam nele (Cf. Jo 7.5). Por isso, não tem sentido dizer que o termo “adelfós” foi empregado no sentido de pertencer à mesma fé, ao mesmo discipulado.  Além disso, há algumas passagens da Bíblia onde os irmãos de Jesus são mencionados juntamente com os discípulos de forma distinta (Cf. Jo 2.12; At 1.13,14; 1Cor 9.5).

- Gama: “Maria perguntou ao Anjo da Anunciação: “Como acontecerá isso, se eu não conheço homem?” (Lc 1.34). Certamente, ela não teria dito isso se anteriormente não houvesse consagrado sua castidade a Deus. Nossa Senhora fez essa consagração antes de saber que seria a Mãe do Filho do Altíssimo

- A pergunta de Maria ao anjo em nada prova que a mesma questionou o anjo porque tinha feito uma consagração a Deus de sua castidade, mas, como o próprio texto deixa claro, porque não entendeu como teria um filho sem relação sexual. Além disso, não encontramos na Bíblia nenhum relato que Maria tinha feito uma consagração a Deus para permanecer virgem. Pelo contrário, Lucas diz que Maria estava desposada, noiva, de José (Cf. Lc 1. 27). Se Maria tivesse feito um voto de consagração de sua virgindade seu casamento seria apenas um fingimento, uma mentira, uma espécie de “aparência social”. Se ela fez o voto depois de casada, seu casamento nunca foi consumado, pois, para isso, convém que ocorra o ato sexual. Não encontramos nenhum ensinamento bíblico que oriente que o marido e a esposa devam viver como irmãos. A privação do sexo no casamento é consentida apenas por algum tempo determinado para o casal dedicar-se à oração. Porém, passado esse tempo, convém que o casal tenha relações sexuais para não cair em tentação. Assevera Paulo: “O marido conceda à esposa o que lhe é devido, e também, semelhantemente, a esposa, ao seu marido. A mulher não tem poder sobre o seu próprio corpo, e sim o marido; e também, semelhantemente, o marido não tem poder sobre o seu próprio corpo, e sim a mulher. Não vos priveis um ao outro, salvo talvez por mútuo consentimento, por algum tempo, para vos dedicardes à oração e, novamente, vos ajuntardes, para que Satanás não vos tente por causa da incontinência” (1Co 7.3-5).

Gama: “Maria continuou virgem após o parto, pois a virgindade é superior ao estado matrimonial”.

- O estado de virgindade é um conselho de Paulo para privar das preocupações e cuidar mais das coisas do Senhor (Cf. 1Cor 7. 25-35). No entanto, em nenhum momento o apóstolo afirmou que o estado de virgindade é superior ao estado matrimonial ou que justifique uma pessoa diante de Deus pelo seu sacrifício de manter-se casto. Se o estado de virgindade é um conselho paulino, o matrimônio e a união sexual são mandamentos divinos (Gn 1.28; 2.24; Mt 19.4-6). É evidente que o mandamento tem maior autoridade que um conselho.
Uma leitura atenta da Bíblia nos permite inferir que a relação sexual é parte essencial do casamento (Cf. Pv 5.18,19; Hb 13.4; 1Co 7.3-9).
A compreensão de que o matrimônio é menos digno de estima do que a virgindade não tem respaldo na Bíblia, mas foi disseminada por tradições humanas que concebiam o sexo como ato pecaminoso, impuro. Ainda no Concílio de Trento (1545-1563) encontramos uma defesa ferrenha da virgindade: “Se alguém disser que o estado matrimonial deve ser colocado acima do estado da virgindade ou do celibato, e que não é melhor e mais abençoado permanecer em virgindade ou em celibato do que se unir em matrimônio, que seja anátema” (Sessão 24, cânon 10).
Portanto, o casamento é remédio contra impureza (Cf. 1Cor 7.1) e não lugar de pecado. O ato sexual não torna uma pessoa imperfeita diante de Deus.  Ele faz parte do estado matrimonial e não pode ser negado por algum dos cônjuges, como ensina Paulo: “O marido conceda à esposa o que lhe é devido, e também, semelhantemente, a esposa, ao seu marido” (1Co 7.3).
Maria não foi agraciada por Deus pelo seu estado de virgindade antes e durante o parto, mas, como ela mesma disse, “Porque contemplou a humildade da sua serva”, “porque o Poderoso me fez grandes coisas” (Lc 1.48,49).

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Maria foi uma discípula fiel de seu próprio Filho. Ela viveu, como ninguém, o mandamento que deu aos serventes: “Fazei tudo o que ele vos disser” (Jo 2.5).  Dizer que ela não permaneceu virgem depois do nascimento de Jesus não a diminui em nada, pois a principal pureza, que é a do coração, Maria conservou quando guardava e meditava as palavras do Senhor (Cf. Lc 2.51). Maria foi bem-aventurada por ser a mãe do Salvador e muito mais por está inclusa entre aqueles “que ouvem a palavra de Deus e guardam!” (Lc 11.27-28).
Esta é a virgindade perpétua que Maria preservou: ser serva humilde e disponível para a graça de Deus em sua vida: “Aqui está a serva do Senhor, que se cumpra em mim conforme a tua palavra” (Lc 1.38). A virgindade espiritual é muita mais significativa do que qualquer virgindade física.

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Lúcio Rufino Pinheiro

segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

IGREJA DE CRISTO E PAPADO (DEBATE)



A IGREJA DE CRISTO PODE SER RESUMIDA EM UMA ÚNICA INSTITUIÇÃO, A ROMANA?

 - Beta: “A Igreja Católica Romana foi a única fundada por Cristo”.

- A Igreja Católica Apostólica não pode ser reduzida a uma única instituição, a Igreja de Roma. A história aponta que, no início da expansão do cristianismo, havia vários núcleos do Cristianismo: Jerusalém, Samaria, Antioquia, Roma, etc. O que aconteceu é que Roma tomou para si o poder sobre as outras comunidades. Além do mais, não podemos resumir a Igreja a uma instituição religiosa. A Igreja é o corpo místico de Cristo, a esposa do Cordeiro.  A Igreja ela não é de Pedro, Paulo, João, mas de todos os que foram redimidos e levados no sangue de Jesus. Fazem parte da Igreja de Jesus todos aqueles que acreditam na sua Palavra, que escutam a voz do verdadeiro pastor, Jesus. Dessa Igreja, segundo o ancião (presbítero) Pedro , Jesus é o "sumo Pastor" (1Pd 5.4).
É preciso ter cuidado com esse discurso que considera a Igreja Católica Romana como a única verdadeira. Esse tipo de discurso acaba por negar a autenticidade das outras tradições cristãs.

Beta: “A única Igreja de Cristo é Católica”.

- Sim, a Igreja de Cristo é Católica e não a Igreja Romana. Pois Católica é uma característica da Igreja (At 1.8). Dessa Igreja fazem parte todas as testemunhas de Cristo em todas as partes do mundo. Romana não é atributo da Igreja Cristã. Isso se comprova pelos credos mais antigos.  A unicidade, catolicidade e apostolicidade da Igreja estão além de uma instituição específica. Caso contrário, teríamos que negar a autenticidade de todas as Igrejas que não têm comunhão com a Igreja Romana. Cristo não fica satisfeito quando querem colocar suas ovelhas no único cercado romano. Essa compreensão de Igreja cristã é reducionista e equivocada.

- Beta: "A  verdadeira Igreja de Cristo é visível na instituição, na sua organização hierárquica" .

- A verdadeira Igreja de Cristo encontra-se no plano espiritual e não institucional. A dimensão externa da Igreja embora seja necessária neste mundo, não se configura como uma característica essencial da Igreja de Jesus.   “Ora,  vós sois o corpo de Cristo, e  individualmente seus membros" (1Co 12.27). "Grande  é este mistério, mas eu falo  em referência a Cristo e à Igreja" (Ef 5.32).
A Igreja é o corpo místico de Cristo (Ef 1.22,23). O apóstolo Paulo pontua um detalhe importante: “o corpo é um e tem muitos membros, e todos os membros, sendo muitos, são um só corpo” (1Co 12.12). Quem está unido a Jesus (cabeça) é membro do corpo (Igreja). Paulo trata a Igreja em sentido espiritual e não institucional. Aliás,  muitas vezes,  Paulo usa o termo εκκλησια  no plural : "αι εκκλησιαι του χριστου"  (as Igrejas de Cristo) (Rm 16.16). É notório que Paulo estava se referindo aos cristãos que, nos mais diversos lugares ouviram a pregação do Evangelho, se converteram e decidiram seguir a Jesus. 

- Beta: “A fé da única Igreja Católica é aquela professada pela Igreja Romana (Romanos 1.7,8)”.

- "Porque, partindo de vós fez-se ouvir a palavra do Senhor, não somente na Macedônia e na Acaia, mas também em todos os lugares a vossa fé para com Deus se divulgou, de tal maneira que não temos necessidade de falar coisa alguma" (1Ts 1.8). Paulo fala da comunidade de Tessalônica. Com base na sua interpretação, poderia muito bem dizer que "a fé da única Igreja Católica é aquela professada pela Igreja de Tessalônica". É próprio do estilo Paulino fazer elogio ou agradecer a Deus por algum aspecto positivo da comunidade. Porém, isso não é argumento para sustentar que a Igreja Romana era superior em relação as outras. No texto citado por você, Paulo diz: "porque em todo o mundo, é proclamada a vossa fé". Aqui se faz referência ao conhecimento que os cristãos de todos os lugares tinham dos irmãos de Roma. Paulo coloca ênfase no fato dos Romanos terem fé e não na obra de sua difusão.

PRIMAZIA DA IGREJA DE ROMA SOBRE AS DEMAIS

- Beta: “Os apóstolos Pedro e Paulo foram mortos em Roma, por isso, a Igreja Romana tem primazia sobre as demais igrejas”.

- O fato de Pedro e Paulo terem morrido em Roma não é argumento para justificar a primazia da Igreja Romana sobre as demais igrejas. Caso consideremos esse argumento verdadeiro, seria mais coerente afirmar que Jerusalém deveria ser a Igreja que teria domínio sobre as outras, pois lá morreu o fundador e o fundamento do Cristianismo, Jesus.

PEDRO E O PAPADO

- Beta: “Pedro foi o primeiro papa, o chefe da Igreja de Roma. Esta verdade está fundamentada em Mt 16,18: “Também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja”.

- Essa ideia de chefe único da Igreja (papado) é bem posterior ao tempo dos apóstolos.  Cada Igreja tinha suas lideranças. O responsável pela Igreja de Jerusalém, berço do Cristianismo, era o apóstolo Tiago (At 15.13).
Com relação ao texto de Mateus 16 convém um melhor aprofundamento. O texto original diz: ὅτι σὺ εἶ Πέτρος” (“Tu és Pedro (petros em grego: pedregulho), “καὶ ἐπὶ ταύτῃ τῇ πέτρᾳ οἰκοδομήσω μου τὴν ἐκκλησίαν  “e sobre esta pedra (Petra em grego, Rocha) edificarei a minha Igreja (ecclesia, sentido de convocados, os que escutaram a convocação).
Jesus na constrói sua Igreja sobre Pedro, porque é fraco (pedregulho), mas sobre a fé de Pedro em Jesus: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo” (Mt 16.16) . Jesus é a Petra, a Rocha. Paulo diz que Jesus é a Pedra principal: “Edificados sobres o fundamento dos apóstolos e profetas, sendo ele mesmo, Cristo Jesus, a pedra angular” (Ef 2.20). O próprio Pedro entendeu que a Pedra é Cristo e nele devemos crer, quando diz, citando a Escritura judaica: “Por isso está na Escritura: Eis que ponho em Sião uma pedra angular, eleita e preciosa; e quem nela crer não será, de modo algum, envergonhado” (1Pd 2.6).
Sendo a fé em Cristo o fundamento da Igreja, “ninguém pode lançar outro fundamento, além do que foi posto, o qual é Jesus Cristo” (1Cor 3.11), assevera o apóstolo Paulo.
Não podemos negar a importância de Pedro e dos demais apóstolos, mas jamais podemos achar que Jesus esteja ali fundando uma instituição religiosa ao modo como pensamos hoje ou estivesse instituindo o papado romano, onde Pedro seria o chefe.

- Beta: “Em 1 Pedro 2.4, Jesus é chamado de 'pedrinha viva'. λίθον (Lithos) é pedrinha”.

- A tradução está equivocada. “Λίθος” , em grego, significa: Pedra, pedra de disco, pedra preciosa, mármore. Λιθιδιον é o termo grego para Pedra pequena. O texto da Carta de Pedro não tem o termo Λιθιδιον (Pedra pequena). Jesus é Λίθος no sentido de preciosa e não no sentido de ser a menor (pedrinha).

- Beta: “Λίθος é uma pedra pequena em comparação com πέτρα”.

- “Lithos” é uma palavra polissêmica , o seu significado vai depender do contexto. No texto de 1Pd 2 a palavra preciosa (entimon) se apresenta três vezes nos versículos 4, 6, 7. Assim, seu contexto indica que se trata de pedra preciosa. A compreensão de “lithos” como Jesus sendo a “pedra pequenina”, não tem conformidade com o contexto. Por favor, pode apresentar alguma tradução da Bíblia em que "lithos" é traduzido por "pedrinha"?

- Beta: “Pedro é o chefe da Igreja porque Jesus deu as chaves o reino dos céus (Cf. Mt 16,19) e confiou a missão de apascentar suas ovelhas ao mesmo” (Cf. Jo 21,15-17).

- Não podemos entender esse "apascentar" como poder sobre toda a Igreja. As ovelhas confiadas a Pedro são aquelas que sem encontram entre os circuncisos (judeus) para quem foi designado para pregar. Todas as ovelhas não foram confiadas a Pedro. O texto de Jo 21.16 não tem a expressão "Todas" indicando universalidade. É a todos os apóstolos que Jesus confiou esse ministério de apascentar, ou seja, de pregar e ensinar: "Ide por todo o mundo, proclamai o Evangelho a toda criatura" (Mc 16.15). Observe que o pastoreio a "toda criatura" é confiada não só a Pedro, mas a todos os apóstolos (a Igreja). "E eles saíram a pregar por toda a parte" (Mc 16.20). Ora, sendo que nenhum dos apóstolos foi instituído ou enviado por Pedro, também não podemos concluir que todas as ovelhas foram confiadas a Pedro. Cada apóstolo, em cada lugar onde chegava e era aceito o Evangelho, uma Igreja ali se fazia presente e era apascentada pelo mesmo. O Novo Testamento não mostra nenhum "poder" especial que conferia a Pedro o direito de apascentar os cristãos de todas as Igrejas ou autoridade sobre os demais apóstolos. Pelo contrário, os apóstolos de Jerusalém  tinham autoridade sobre Pedro para enviá-lo em missão (Cf. At 8.14).
Os católicos romanos defendem que Jesus deu as "chaves" (Cf. Mt 16.19) somente para Pedro e seus sucessores da Igreja Romana. Se assim é verdade, teremos que admitir que também as palavras de Jesus: "afasta-te de mim satanás! Tu me serve de pedra de tropeço, porque não pensas as coisas de Deus, mas as dos homens" (Mt 16.23), devem ser atribuídas somente a Pedro e aos seus sucessores da Igreja Romana. E outros apóstolos, também não receberam as chaves, não foram sucessores de Pedro e nem bispos da Igreja Romana?
O poder das chaves foi dado para todos e não somente para Pedro e consiste não em poder, mas em ser portador do perdão divino, perdoar pecados (Cf. Mt 18.17-20; Jo 20.22-23).

PEDRO FOI BISPO DE ROMA?

- Beta: “Pedro foi o primeiro bispo de Roma. Este fato é comprovado pela Tradição e pela Bíblia (Cf. 1Pd 5,13).

- Não existe evidência bíblica que confirme que Pedro foi bispo de Roma. O texto de 1Pd 5.13 que diz: “A que está em Babilônia, eleita como vós, vos saúda”, convém ser interpretado com muita prudência. No contexto neotestamentário, essa analogia de “Babilônia” com “Roma” somente tem clara evidência no Livro do Apocalipse (14,8;16,9; 17,5), escrito por volta do ano 95 d.C. O gênero literário da Primeira Carta de Pedro não é apocalíptico. Assim, não havia razões para Pedro falar de Roma de forma “misteriosa”. A Babilônia mencionada por Pedro poderia ser uma cidade localizada às margens do Rio Eufrates, onde existia uma enorme presença de judeus. Pedro, para quem foi “confiado o Evangelho dos circuncisos” (Cf. Gl 2.8), é possível quem tenha pregado naquela região.
Os argumentos com base na Patrística parecem que são frutos de interpretações que tentam alinhar a morte de Pedro em Roma com seu ministério. Eusébio de Cesareia (265-339 d.C.) diz que Lino foi o primeiro bispo de Roma: “Depois do martírio de Paulo e Pedro, Lino foi designado como primeiro bispo de Roma. Ele é mencionado por Paulo quando escreve de Roma a Timóteo, na despedida ao final da carta” (História Eclesiástica, Livro III, 4,9). Alguém poderá questionar que a expressão “depois do martírio de Paulo e Pedro” é um indicativo que Lino foi o sucessor de Pedro após o seu martírio. Porém, a expressão parece mais indicar uma contextualização histórica, tendo em vista que menciona também a morte do apóstolo Paulo (que não foi bispo de Roma) do que demonstrar uma sucessão do bispado.   Segundo Eusébio, Pedro pregou em várias regiões, “por fim chegou a Roma e foi crucificado com a cabeça para baixo, como ele mesmo pediu para sofrer” (História Eclesiástica, Livro III, 1,2). A chegada de Pedro a Roma ocorreu no final de sua vida. Se Pedro estava o tempo todo em Roma como Bispo não havia necessidade de Eusébio afirmar que “chegou a Roma”. Convém lembrar que a Igreja Católica sempre foi detentora dos escritos dos Padres da Igreja. Que garantia temos que os textos da Patrística não foram adulterados para justificar o posicionamento da Igreja Católica Romana de que Pedro foi bispo de Roma? Trata-se apenas de um questionamento e não de uma afirmação. Portanto, entre as narrativas bíblicas que não afirmam que Pedro foi bispo de Roma e as várias interpretações da Patrística, prefiro ficar com a fonte bíblica.  
Sabemos que Paulo escreveu a Carta aos Romanos no ano 55 d.C. Segundo  defende a ICAR, Pedro chegou em Roma no ano 42, ou seja, quando Paulo escreveu sua carta aos Romanos, Pedro já era bispo há 13 anos. Não parece estranho que Pedro tendo um bispado consolidado em Roma não seja mencionado por Paulo no endereço (Rm 1-7) e nas saudações (Rm 16.1-16) da Carta aos Romanos? Parece bastante sensato o comentário da Bíblia Edição Pastoral da ICAR sobre a Igreja de Roma: “Nada sabemos sobre a origem da comunidade cristã de Roma, nem sobre suas condições na época de Paulo. As únicas informações são as que podem tirar desta carta. [...] Prisca e Áquila, um casal judeu-cristão, vítimas dessa expulsão, foram para Corinto, onde se encontram com Paulo (At 18.1-3), que realizava a segunda viagem missionária (50-52 d.C.). É através deles que Paulo fica informado sobre a situação dos cristãos em Roma”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Igreja de Cristo não é identificada por uma localidade geográfica especifica (Roma), por uma Pessoa (Papa), pelo poder sua estrutura organizacional (Instituição), pelo CGC (cadastro geral de contribuintes), pela cor ou estrutura de templos.  A Igreja é o corpo de Cristo. Ele é a Cabeça , o único e supremo Pastor da Igreja.

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Lúcio Rufino Pinheiro

domingo, 8 de dezembro de 2019

INVEJA: UM SENTIMENTO MALÉFICO

Invejosos são como cobras que estão sempre prontas para destilar seu veneno maléfico. Os invejosos estão ao nosso redor: vizinhos, no ambiente de trabalho, na família, na igreja, etc. 
Quem é o invejoso? É alguém que nunca está feliz com o sucesso do outro. O invejoso é um fracassado que não aceita o sucesso de outra pessoa. Ele quer ser como o outro, mas como não consegue, movido por um sentimento inconsciente de raiva, trama a destruição do seu imaginário concorrente.
Como identificar um invejoso? Conte seus sonhos e realizações. Se a pessoa demonstrar raiva, tristeza, se agir com críticas destrutivas, você está diante de um invejoso. Um exemplo da Bíblia é a história de José. Quando o mesmo contou sobre seu grandioso sonho, os irmãos, com inveja, tramaram sua destruição.
Como livrar-se dos invejosos? É simples. Nunca fale sobre seus sonhos ou sobre suas conquistas.
O invejoso é alguém digno de misericórdia, pois é um infeliz que precisa libertar-se de um sentimento que destrói a si mesmo e o outro.
Tenha muito cuidado com os invejosos ao seu redor, pois eles são perigosos como as cobras.

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Lúcio Rufino Pinheiro

DOGMA DA IMACULADA CONCEIÇÃO (DEBATE)



Paulo diz em Rm 3.9: "Pois acabamos de provar que TODOS, tantos os judeus como os gregos, estão debaixo do pecado". É possível conciliar a mensagem bíblica com o dogma da Igreja Católica Romana que diz que Maria foi PRESERVADA do pecado original?

- Alfa: “Paulo está se referindo às regras e não às exceções: sua mãe é uma exceção”.

- Uma boa interpretação do texto bíblico não pode desconsiderar seu sentido próprio, literal. O texto de Romanos 3 não menciona exceções, pois se refere a nossa condição humana de pecadores. Nesse sentido, TODOS pecaram e necessitam da graça divina.

- Alfa: “Toda criatura é pecadora?”

- Toda criatura humana foi contaminada pelo  pecado. Maria é  uma criatura humana. Logo, Maria    foi concebida em pecado. 
Jesus veio salvar o pecador. Se considerarmos como verdadeira a premissa que Maria não tinha pecado,  teremos que aceitar como verdadeira a conclusão que  Maria não precisava de um Salvador.

- Alfa: “Ora, também as criancinhas aquém da idade da razão não se excluem na regra geral que todos pecaram”.

- As crianças se incluem no “todos pecaram”, pois elas herdaram o pecado de Adão. Disse Davi: “Eu nasci na iniquidade, e em pecado concebeu minha mãe” (Sl 51.5). A própria doutrina Católica reconhece que as crianças têm o pecado original.

- Alfa: “Nos capítulos 1 a 3 de Romanos, o Apóstolo Paulo está tratando de pecados pessoais, obviamente, as crianças recém-nascidas não estão incluídas”.

- Rm 1 a 3 fala da depravação  total do homem, assim sendo, e as crianças estão incluídas.  Pecado aqui não deve ser entendido apenas como transgressão moral, mas como realidade que faz parte da nossa natureza decaída. Nós não  somos pecadores porque cometemos pecados, mas cometemos pecados porque somos pecadores. "Pois já temos demonstrado que todos, judeus e gregos, estão debaixo do pecado" (Rm 3.9). "Pois todos pecaram e carecem da glória de Deus" (Rm 3.23). Todo pecado pessoal cometido tem sua causa na nossa natureza pecaminosa. Rm 5.12, Paulo trata do pecado que todos herdamos: "Portanto, assim como por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado, a morte, assim também a morte passou a todos os homens, porque todos pecaram". Da mesma forma que a graça inclui todos: "Pois assim como, por uma só ofensa, veio o juízo sobre todos os homens para condenação, assim também, por um só ato de justiça, veio a graça sobre todos os homens para a justificação que dá vida" (Rm 5.18). Aqui não se fala de pecados pessoais, mas do pecado que levou a todos à condenação .

- Alfa: “A vontade, sustentada pela graça, pode tomar a decisão de não pecar?"

- A graça ajuda a pessoa a resistir ao pecado. No entanto, deixar de pecar é impossível, a não ser após a morte. A Bíblia diz: “Porque sete vezes cairá o justo e se levantará” (Pv 24.16).
Paulo é claro sobre o poder do pecado que habita em nós: “porque não faço o bem que prefiro, mas o mal que não quero. Mas, se faço o que não quero, já não sou eu quem o faz, e sim, o pecado que habita em mim” (Rm 7.19-20). Após o pecado original a nossa vontade com relação às realidades espirituais, amor e temor a Deus, foi corrompida, de forma que, somente pela fé em Cristo, favorecido pela sua graça, o homem pode viver reconciliado com Deus. Somos pecadores. Por mérito próprio, jamais podemos viver na presença de Deus. Agora, cobertos pelo manto da graça, o pecado vai perdendo sua força, de modo que, com o passar do tempo, vamos progredindo na vida nova em Cristo.


- Alfa: “Na sua ótica então até Jesus pecou. Todos são todos”.

- Pelo contexto do texto mencionado e pelo conjunto das Escrituras, não cabe essa interpretação. Jesus não se encaixa no todos por uma simples razão: Ele não assumiu a nossa natureza humana decaída, mas nossa natureza perfeita, como Deus a criou. Jesus foi igual a nós em tudo, exceto no pecado (Cf. Hb 4.15). Com relação à Maria é diferente. Ela herdou a natureza humana corrompida pelo pecado. Portanto, ela não pode ser uma exceção. Se Maria se incluir na exceção, teremos que concluir que ela não precisava da graça salvadora de Cristo. O que não é verdade.

-Alfa: “Jesus é imaculado por natureza, pois Ele é Deus. Maria é imaculada pela graça. Portanto, sem a graça de Deus, Maria não teria sido preservada do pecado original”.

- Quanto ao fato de Jesus ser imaculado por natureza, estamos de acordo. Porém, não posso afirmar o mesmo sobre Maria. Mesmo que seja pela graça, não podemos afirmar que Maria é a Imaculada Conceição, pois, em nenhuma passagem da Escritura temos o testemunho de que, por graça, Maria foi preservada do pecado original. A graça veio para todos em Jesus. Ela nos oferece condições de ser salvos, de superar as tentações. Porem, não retira de nós a possibilidade de pecar, pois nossa natureza se encontra decaída pelo pecado. A experiência é testemunha que não deixamos de pecar mesmo depois de recebermos a graça salvadora, pois, esse favor imerecido, não anula nossa natureza pecadora. Assevera Paulo: “Mas, se eu faço o que não quero, já não sou eu quem o faz, e sim o pecado que habita em mim” (Rm 7.20).

- Alfa: “Todo dogma é verdadeiro para a Igreja, do contrário não seria dogma”.

- Todo dogma é verdadeiro para quem? Para toda a Igreja de Cristo? De forma alguma.  Muitos dogmas que foram determinados pela Igreja Romana e por outras igrejas não têm aceitação de todos os que pertencem à verdadeira Igreja, pois não são respaldados nas Escrituras, mas em tradições humanas.  O dogma da Imaculada Conceição foi instituído em 1854 pelo papa Pio IX, ou seja, por mais de mil e oitocentos anos nunca foi uma verdade de fé obrigatória e inquestionável.  

- Alfa: “O dogma da Imaculada Conceição tem base na interpretação bíblica da Tradição da Igreja”. E a Interpretação da Bíblia dos Padres da Igreja é plenamente confiável".

- Toda verdade de fé deve ser fundamentada na Bíblia e não apenas em interpretações da Tradição.  Você destaca a importância da Tradição e do Magistério para a interpretação da Bíblia. Os padres da Igreja deram grande contribuição para hermenêutica bíblica. No entanto, alguns cometeram erros na interpretação bíblica. Tomemos como exemplo o texto de Pv 8.22. Jerônimo cometeu um equívoco ao traduzir "intencionalmente" na Vulgata o termo hebraico "qânanî", criou/criar das Escrituras Hebraicas e εκτισεν da Septuaginta como "possedit me" (possuiu-me/adquiriu-me), adulterando assim o sentido original do texto hebraico, apenas para combater o arianismo, ou seja, para fazer um ajustamento do texto bíblico com a doutrina Católica. Poderia citar outros textos que Jerônimo adulterou, mas vou ficar somente com o texto de Provérbios. A "boa intenção" de Jerônimo não deve ser elogiada, mas, pelo contrário, deve ser reprovada, pois convém que o tradutor seja fiel ao texto original. Com uma boa exegese é possível compreender Pv 8.22 sem necessidades de adaptações ou traduções inadequadas do texto.
Assim, o argumento que o dogma da Imaculada Conceição deve ser aceito com base na interpretação bíblica da Tradição não se sustenta, pois, como apresentamos no exemplo acima, os Padres da Igreja  nem sempre fizeram interpretações bíblicas confiáveis.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Não parece estranho que o dogma da Assunção não tenha sido definido por nenhum dos Concílios da Igreja dos primeiros séculos? Por que um fato extraordinário, como o da “Imaculada Conceição de Maria”, não foi tratado em nenhum dos escritos dos apóstolos? São questões para reflexões.

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Lúcio Rufino Pinheiro

DIVINDADE DE CRISTO (DEBATE)


A “expressão “Eu Sou” (ἐγὼ εἰμί ) que se encontra em Jo 8.58 e em outros textos,  tem relação com a revelação divina a Moisés (Cf. Ex 3.14). Diz respeito à natureza divina.  Se não diz respeito à natureza divina,  questionamos:
1.       Por que os judeus ficaram revoltados com Jesus ao usar a expressão “Eu sou” (Cf. Jo 8.21-59)?
2.       Por que os guardas “recuaram e caíram por terra” (Jo 18. 5-7) quando Jesus disse sou eu (em grego, ἐγὼ εἰμί  - eu sou)?

3.       Segundo Jo 9.38, o cego curado adorou Jesus. Se Jesus não é Deus, por que não reprendeu o cego que fez uma atitude de adoração que só compete a Deus?
4.       O que significa a expressão: “eu e o Pai somos um?” (Jo 10.30);
5.       O que significa a expressão: “O pai está em mim, e eu estou no Pai”? (Jo 10.38);
6.        O que significa a confissão de fé de Tomé, “Senhor meu e Deus meu” (Jo 20.28)? Se Jesus é Deus, por que o mesmo não corrigiu Tomé ao chamá-lo de Deus e Senhor?

MISTÉRIO DA ENCARNAÇÃO
O mistério da encarnação consiste em afirmar que Deus encarnou-se, assumiu a natureza humana de forma que na pessoa do Filho, permanecem as duas naturezas, divina e humana. Querer separar as naturezas de Cristo é uma heresia, combatida desde os primeiros séculos do Cristianismo. A Palavra diz que Jesus é Deus encarnado, "No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus”. “E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós..." (Jo 1.1,14); e "porque nele habita corporalmente toda a plenitude da divindade" (Cl 2.9). Jesus, portanto, plenamente Deus e plenamente homem. Na profissão de fé de Tomé é também revelada a divindade de Jesus: "Respondeu-lhe Tomé: Senhor meu, e Deus meu!" (Jo 20.28). 1Jo 5.7: “Pois há três que dão no céu: o Pai, a Palavra e o Espírito Santo; e estes três são um só”;Em 1Jo 5.20, sobre Cristo, diz: “Este é o verdadeiro Deus e a vida eterna”.

“FILHO DE PEIXE, PEIXINHO É”
“Sou filho de Deus, logo sou Deus”; “Anjos são filhos de Deus, logo são de natureza divina”, argumentam os que negadores da divindade de Cristo.
Com relação ao argumento dos que negam a divindade de Cristo, refutamos com os seguintes argumentos:
As premissas estão erradas. Não somos filhos legítimos de Deus, mas adotados. Somos filhos no Filho (dimensão espiritual). Filho legítimo é só Jesus. "E nos predestinou para sermos filhos de adoção por Jesus Cristo, para si mesmo, segundo o beneplácito de sua vontade" (Ef 1.5). A carta de São Paulo aos Gálatas nos deixa bem claro: “porque todos sois filhos de Deus pela fé em Jesus Cristo” (Gl 3.26).
Sobre os anjos como filhos de Deus, refutamos: anjos são criaturas de Deus, seres espirituais. Não são chamados filhos de Deus e nem têm atributos divinos. O que é criado é inferior ao que cria. Anjos não têm a mesma natureza divina. Somente o Pai, o Filho e o Espírito Santo têm a mesma natureza, ou seja, a divina. Repito: Filho legítimo Deus só tem um: Jesus.

JESUS É O FILHO, OS ANJOS SÃO MINISTROS
"Mas do Filho diz: O teu trono, ó Deus, subsiste pelos séculos dos séculos, e cetro de equidade é o cetro do teu reino"(Hb 1.8).
O texto de Hb 1.8 cita o salmo 45.6-7. O rei mencionado pelo salmista é humano, no entanto, é tratado como o Deus verdadeiro: "o teu trono ó Deus é para todo o sempre" (v.6). O autor da Carta aos Hebreus aplica o salmo para demonstrar a divindade de Cristo e sua superioridade em relação aos anjos. Por que autor escolheu esse texto do salmo e não outro? Não sei. O texto hebraico usa o termo elohim. No texto de Hebreus, o termo usado é θεός (Deus): "Ο θρόνος σου ό θεός " (o teu trono, ó Deus). A tradução "Deus é o seu trono" não parece adequada, pois, no texto grego, não tem o verbo ser (εστίν - é ), mas apenas o pronome σου (teu).

EM QUAL NATUREZA JESUS FOI,  POR UM POUCO, MENOR QUE OS ANJOS?
 “Fizeste-o, por um pouco, menor que os anjos” (Hb 2.7).
O texto de Hebreus 2 não trás a "expressão natureza humana", mas pelo contexto entende-se que está falando do Cristo em sua humanidade. Jesus foi menor que os anjos em sua humanidade. Antes de sua ressurreição e ascensão (sua glorificação) Jesus escolheu não demonstrar seu poder divino a todo momento, por isso, apresentou-se menor que anjos. O versículo 17 diz que "convinha que, em todas as coisas, se tornar-se semelhante aos irmãos". Mas, sendo pessoa divina, Deus sujeitou todas as coisas ao Filho "debaixo de seus pés" (Hb 2.5,8). Hb 1.3 diz que após a purificação dos pecados, Jesus tornou-se "tão superior aos anjos quanto herdou mais excelente nome do que eles".

JESUS ACIMA DOS ANJOS
No que diz respeito a sua divindade, Jesus está acima dos anjos e é mais excelente (Hb 1.4), pois "todas as coisas estão debaixo de seus pés (Ef 1.22). Ele está acima de tudo, pois nele e por ele foram criadas todas as coisas. Está escrito: "o qual é imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação; porque nele foram criadas todas as coisas nos céus e na terra, as visíveis e as invisíveis, sejam tronos, sejam dominações, sejam principados, sejam potestades; tudo foi criado por ele e para ele. Ele é antes de todas as coisas, e nele subsistem todas as coisas" (Cl 1.15-17). Depois de subir aos céus , a natureza humana de Jesus é revestida de glória, assim como a nossa será após a ressurreição (Cf. Rm 8.30).

JESUS ABANDOU A NATUREZA HUMANA APÓS SUA MORTE?
Uma vez que Jesus se encarnou, assumiu nossa natureza humana para sempre. A segunda Pessoa possui as duas naturezas também na eternidade.  A Bíblia diz que Jesus é Senhor (Divindade) e que ressuscitou dos mortos (humanidade)(Cf. Rm 10.9). As realidades divina e humana continuam unidas em uma só Pessoa.

CONSIDERANDO QUE NÃO HÁ SEPARAÇÃO DAS NATUREZAS DIVINA E HUMANA DE JESUS, DEUS MORREU OU NÃO NA CRUZ?
 Para a fé cristã, as naturezas divina e humana estão unidas em uma só pessoa  (União hipostática) Jesus é totalmente Deus e homem. Na cruz, o Deus  encarnado é humilhado, torturado e morre. "O qual, subsistindo em forma de Deus, não considerou o ser igual a Deus coisa a que se devia aferrar,   mas esvaziou-se a si mesmo, tomando a forma de servo, tornando-se semelhante aos homens;  e, achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, tornando-se obediente até a morte, e morte de cruz. Pelo que também Deus o exaltou soberanamente, e lhe deu o nome que é sobre todo nome" (Fl 2.6-9). Morrer, para a fé cristã não significa que deixou de existir. Por isso, a sua ressurreição é sinal que a vida continua, que a morte não é fim. Isso é uma questão de fé, o homem apenas racional não entenderá jamais. Paulo diz: "Porque a palavra da cruz é loucura para os que perecem; mas para nós, que somos salvos, é o poder de Deus. Porque está escrito: Destruirei a sabedoria dos sábios, E aniquilarei a inteligência dos inteligentes.  Porque os judeus pedem sinal, e os gregos buscam sabedoria; Mas nós pregamos a Cristo crucificado, que é escândalo para os judeus, e loucura para os gregos. Mas para os que são chamados, tanto judeus como gregos, lhes pregamos a Cristo, poder de Deus, e sabedoria de Deus. Porque a loucura de Deus é mais sábia do que os homens; e a fraqueza de Deus é mais forte do que os homens” (1Cor 1.18;22-25). 
Judeus e gregos jamais entenderam a ideia que Deus pudesse se encarnar e morrer. A encarnação e morte de Deus eram escândalo e loucura para os judeus.  Parece que também para alguns cristãos. 
A morte de Cristo  não é derrota, fim, fracasso, mas vitória contra o mal, redenção, libertação, elevação, glória.  Paulo diz: "Mas longe esteja de mim gloriar-me, a não ser na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, pela qual o mundo está crucificado para mim e eu para o mundo" (Gl 6.14).
Portanto, a morte de Deus não significa aniquilamento da natureza divina de Jesus, o que impossível, mas sim, que o Verbo Encarnado experimentou a realidade da morte. Assim, como a natureza humana e a natureza divina estão unidas em uma só Pessoa é correto afirmar que Deus morreu na cruz, pois Jesus é Deus.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
 Pra quem nega que o Filho tem a mesma essência (natureza) do Pai, convém lembrar o que diz João: "Quem é o mentiroso, senão aquele que nega que Jesus é o Cristo? Esse mesmo é o anticristo, esse que nega o Pai e o Filho.  Qualquer que nega o Filho, também não tem o Pai; aquele que confessa o Filho, tem também o Pai" (1Jo 2.22,23).

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Lúcio Rufino Pinheiro

sábado, 7 de dezembro de 2019

SUBSTANTIVO ANARTRO PRESENTE EM JO 1.1



Em Jo 1.1 está escrito: “και θεος ην ο λογος” (“e o Verbo era Deus”). Na Tradução do Novo Mundo, lemos: “e a Palavra era um deus”. Esta tradução está correta?
Segundo os que defendem que a tradução mencionada está correta, o substantivo Deus (θεος) é anartro, ou seja, vem desacompanhado do artigo. Assim, nesses casos, “θεὸς” deve ser traduzido indefinidamente (um deus), pois não se refere ao Deus Pai, mas a um deus.  Os que usam desse argumento gramatical, justificam que Jesus não é Deus, mas simplesmente um ser divino, uma espécie de outro deus intermediário entre Deus (Pai) e a humanidade.

REFUTAÇÃO:
1)      O substantivo “θεος” (Deus) é usado mais de 1319 vezes (aproximadamente) no Novo Testamento, sendo que, em mais de 283 casos, mesmo aparecendo sem o acompanhamento do artigo, faz referência a Deus como ser definido.
2)      A ausência de artigo não exige que um substantivo seja traduzido no seu sentido indefinido. Vejamos alguns exemplos:
a)      Rm 9.5 - “θεος” (Deus), não vem acompanhado do artigo, mas trata-se de Deus (Senhor, Jeová, Javé). Aqui, os que defendem o argumento do substantivo anartro, se contradizem, pois não traduziram “θεος” como “um deus”, mas como Deus, como mostra a Tradução do Novo Mundo: “Deus que está sobre tudo”;
b)      2Cor 2.21: “θεος” aparece sem artigo, mas com certeza, diz respeito a Deus Pai. Mais uma vez, aqui também, não traduzem como “um deus”: “e quem nos ungiu, é Deus” (TDM);
c)       Fl 2.13 – Aqui, mais uma vez, o substantivo “θεος” é anartro, mas não é traduzido segundo a regra dos que defendem que não se trata de Deus, mas de um ser divino: “pois Deus é aquele” (TNM);
d)      1Ts 2.5 – “θεὸς μάρτυς” (Deus é disto testemunha”). O substantivo Deus (θεὸς) não é acompanhado de artigo no grego, no entanto, a Tradução do Novo Mundo, também não traduz “um deus é testemunha”, mas,  “Deus é testemunha”;
e)      Jo 1.18- “Ninguém jamais viu a Deus (θεὸς), o Deus (θεὸς) unigênito (μονογενὴς)  que está no seio do Pai, é quem o revelou”. No texto grego, não aparece o artigo precedendo o substantivo “θεὸς” nas duas ocorrências.  No entanto, a Tradução do Novo Mundo, traduz o primeiro termo como Deus, se referindo ao Pai, e o segundo como “o deus”, se referindo ao Deus unigênito, Jesus: “Nenhum homem jamais viu a Deus; o deus unigênito, que está ao lado do Pai, é que O revelou”.
O referido texto é uma das provas da divindade de Cristo. A expressão “unigênito”, em grego “monogenes” (μονογενὴς), explicita a divindade de Cristo e sua origem do Pai, de tal forma que, como disse Jesus para Filipe, “quem me vê a mim vê o Pai” (Jo 14.9). Fica evidente que, ao traduzir equivocadamente o substantivo anartro “θεὸς” como “o deus”, há uma intenção ideológica para sustentar a negação da divindade de Cristo.
3. Em outras passagens, o substantivo anartro “θεὸς” aparece nos seguintes modos: Relação de contraste ( Rm 7.8; Mt; 4.4; Mt 6.24; Lc 12.21; At 5.29); Quando é usado pela voz de judeu  e pagãos ( At 12.22; At 28.6; At 14.11; Jo 9.16; Jo 10.33;); Em nomes próprios ou títulos( Mt 5.9; Jo 1.12; Rm 8.14; Mt 14.33; At 7.43, Mt 4.9; Mt 4.10); Em questões sobre a divindade (Rm 1.16; Rm 1.17; Rm 1.18; Rm 13.1; Rm 16.27; 1Cor 8.4; 1Cor 8.5; 1Cor 8.6).  São apenas alguns textos dentre tantos outros em que o substantivo Deus não é acompanhado por artigo e nem por isso é traduzido de forma indefinida.

Portanto, pelos exemplos apresentados, constata-se que o argumento defendido pelos que negam a divindade de Cristo, a saber: onde aparece o substantivo anartro, “θεὸς” deve ser traduzido por “um deus” não tem sustentação segura. Assim, no texto de Jo 1.1: “e o verbo era Deus”, o substantivo “θεὸς” refere-se a “Deus” na pessoa de Jesus e não a “um deus” indefinido.

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Lúcio Rufino Pinheiro

DIA DO SENHOR (DOMINGO)


"Ninguém, pois, vos julgue pelo comer, ou pelo beber, ou por causa de dias de festa, ou de lua nova, ou de sábados, que são sombras das coisas vindouras; mas o corpo é de Cristo" (Cl 2.16-17).
O que Paulo quis dizer com "sombra das coisas vindouras"? O que haveria de vir? E de quem é a sombra no texto?
Paulo combate a heresia existente entre os colossenses. Adverte os cristãos de Colossos “para que ninguém vos engane com raciocínios falazes” (Cl 2.4).  Essa heresia tinha relação com práticas judaicas como circuncisão (Cl 2.11), festas (Cl 2.16) e alimentos e vestimentas (Cl 2.20-22). Os versículos 16 e 17 do capitulo 2, tratam da advertência de Paulo sobre o cerimonialismo. Especificamente, o versículo 16 faz referência a um calendário de culto: “dias de festa”, “lua nova”, “sábados”.  Por mencionar o “sábado”, tudo indica que existia algum aspecto judaico na heresia colossense. No versículo 17, Paulo diz que “tudo isso”, as práticas cerimonias, “tem sido sombra das coisas que haviam de vir”. Paulo, em Rm 15.4 e 1Cor 10.1-11, afirma que tudo o que foi escrito, ou seja, o Antigo Testamento, tinha como finalidade nos ensinar, de nos deixar exemplos , de nos advertir  de forma que não repitamos os mesmos erros do povo da Antiga Aliança. Tudo o que foi escrito encontra seu sentido completo, pleno em Cristo. “O corpo é de Cristo” (Cl 2.17). Paulo usa o termo σῶμα (Soma). Aqui tem sentido figurado daquilo que é real, total, completo, ou seja, a realidade encontra-se em Cristo. Em Cristo, através de sua encarnação, “nele, habita, corporalmente, toda a plenitude da Divindade” (Cl 2.9). Diante da realidade que é Cristo, plenitude da Divindade, todas as cerimonias podem ser omitidas e ninguém pode ser julgado se não praticá-las (Cf. Cl 2.16), pois elas são apenas “sombras”, em grego, σκιὰ (skia), que significa: sobra, obscuridade, trevas, aparência, coisa sem valor (Cf. texto grego: Mt 4.16; Lc 1.79; At 5.15; Hb 8.5).
Portanto, em Cristo, aquele que havia de vir, tudo encontra seu sentido pleno. As cerimônias, inclusive a guarda do sábado, são sombras, diante de Cristo. Depois do Evangelho, Cristo encarnado, todas as práticas cerimoniais antigas são ressignificadas ou até mesmo podem ser omitidas sem que sejamos julgados por isso. “Para a liberdade foi que Cristo nos libertou. Permanecei, pois, firmes e não vos submetais, de novo, a jugo de escravidão” (Gl 5.1).

DISTANCIAMENTO DA GUARDA DO SÁBADO
No Antigo Testamento Deus descansou de suas obras. No Novo Testamento, Deus continua trabalhando: "Por isso os judeus perseguiram a Jesus, porque fazia estas coisas no sábado. Mas Jesus lhes respondeu: Meu Pai trabalha até agora, e eu trabalho também. Por isso, pois, os judeus ainda mais procuravam matá-lo, porque não só violava o sábado, mas também dizia que Deus era seu próprio Pai, fazendo-se igual a Deus" (Jo 5.16-18). Jesus e os apóstolos eram judeus, por isso, muitas vezes foram à sinagoga ou ao templo para participar das orações determinadas. No entanto, após a ascensão de Jesus, os cristãos passaram a se distanciar de algumas práticas judaicas, inclusive o sábado. O dia do Senhor passa a ser o primeiro dia da semana, o domingo. Em At 20.7 está escrito: "No primeiro dia da semana, tendo-nos reunido a fim de partir o pão..." A expressão "partir o pão" significa a celebração da ceia cristã (culto).

COM RELAÇÃO AO TEXTO DE ATOS 17.2
“Paulo, segundo o seu costume, foi procura-los e, por três sábados, arrazoou com eles acerca das Escrituras”.
Os “defensores do Sábado” se baseiam nesse texto para dizer que Paulo continuou observando o sábado, como dia sagrado. Porém, o texto de Atos não diz que Paulo foi à sinagoga para cumprir preceito, mas para "discutir". Como estando entre os gregos, foi também em um de seus templos (Cf. At 17.16-31). Nem por isso, guardava costumes gregos.

COM RELAÇÃO AO TEXTO DE ATOS 22.3
“Sou judeu, nascido em Tarso da Cilícia, mas criado nesta cidade. Fui instruído rigorosamente por Gamaliel na lei de nossos antepassados, sendo tão zeloso por Deus quanto qualquer de vocês hoje”.
Questionam os defensores do sábado: “Como não observava a guarda de nenhum dia se ele mesmo se define como instruído e zeloso da lei dos judeus?”
Com relação ao questionamento acima, afirmamos: Paulo faz um relato da sua conversão, lembrando-se de sua vida passada quando vivia nos preceitos do judaísmo. O texto não indica que ele seguia, a partir de sua conversão, os costumes judaicos.
Portanto, o texto de Atos 22.3 não é argumento seguro para sustentar que Paulo continuou seguindo os costumes judaicos. Pelo contrário, Paulo utilizou-se de seus conhecimentos e experiência no judaísmo, para apresentar o Evangelho para os próprios judeus.

CONSIDERAÇÕES FINAIS:
Após a ressurreição de Jesus, os cristãos não mais passaram a observar o sétimo dia, mas o primeiro dia da semana como dia descanso. O domingo é para os cristãos o “dia do Senhor” (κυριακῇ ἡμέρᾳ -Cf. Ap 1.10)  em memória de sua ressurreição (Cf. At 20.7;1Cor 16.2). Todos os dias são santos para o Senhor. No entanto, os cristãos reservaram o domingo para santificarem suas próprias vidas na escuta da Palavra e na adoração ao Senhor.

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Lúcio Rufino Pinheiro